À necessidade de dar mais atenção às águas de transição e costeiras, uma área de gestão integrada da água que tem recebido menos atenção do que o necessário, apesar da sua gestão integral no quadro de regiões hidrográficas ser obrigatória desde a aprovação da Diretiva Quadro da Água (DQA), em 2000

O tema deste XII Congresso Ibérico responde a quatro ideias fundamentais.

A primeira responde à necessidade de dar mais atenção às águas de transição e costeiras, uma área de gestão integrada da água que tem recebido menos atenção do que o necessário, apesar da sua gestão integral no quadro de regiões hidrográficas ser obrigatória desde a aprovação da Diretiva Quadro da Água (DQA), em 2000, e da Diretiva Quadro Estratégia Marinha (DQEM), em 2008.

A ligação entre a gestão das bacias hidrográficas e o estado das águas de transição e costeiras é bem conhecida. Assinala-se, por exemplo, o papel das cheias, como principal fonte de sedimentos, na manutenção dos sistemas costeiros, nomeadamente na manutenção das praias e outros elementos da linha de costa, ou a importância dos contributos da água doce, rica em nutrientes, para a funcionalidade do ecossistema marinho costeiro, com impacto direto na produtividade pesqueira. Da mesma forma, sistemas costeiros funcionais fornecem proteção efetiva a rias, estuários e outras águas de transição, bem como a toda a faixa litoral, por exemplo, em relação à subida do nível do mar devido às alterações climáticas e seu possível efeito no aumento da salinização em certos aquíferos costeiros, ou o impacto de temporais marítimos. Assinala-se também o grande valor intrínseco de muitos dos ecossistemas costeiros e de transição. Por exemplo, o Delta do Ebro, a Albufeira de Valência, o Mar Menor, o estuário do Guadalquivir, os sapais de Doñana, o estuário do Guadiana, os sistemas lagunares costeiros do Algarve, o Mar da Palha no estuário do Tejo, os estuários do Mondego, Douro e Minho, e as rias da Galiza e da Cantábria.

Neste âmbito, estas e outras questões serão abordadas na área temática do congresso intitulada “Águas de transição e costeiras: reinterpretando a sustentabilidade das bacias numa perspetiva costeira”.

A segunda ideia subjacente ao tema do Congresso respeita à evidência de que a melhoria contínua do conhecimento disponível, embora sendo uma base essencial que deve continuar a ser reforçada, não é suficiente. Os principais nós górdios para uma transição hídrica justa que nos permita recuperar a saúde dos ecossistemas aquáticos, alcançar um uso mais sustentável da água e adaptar às mudanças climáticas, não estão tanto nas lacunas de conhecimento, mas na falta de governança. A muitos debates antigos e ainda não resolvidos, como os relativos à racionalidade de diferentes albufeiras, transvases e outras obras hidráulicas, somam-se novos debates, como os conflitos hídricos relacionados com a mineração, a expansão de energias renováveis, ou como garantir o direito humano à água e ao saneamento, evitando a pobreza hídrica. Destes conflitos emergem outros debates sobre governança, como a distribuição de competências, os modelos de participação cidadã, o quadro normativo ou o papel das instituições envolvidas no planeamento e gestão da água. Esses aspetos, juntamente com a dimensão educacional e cultural da transição hídrica, serão objeto da área temática “Água, conflitos e mobilizações sociais: criando modelos de cogovernança para a defesa do bem comum".

O Congresso também dará atenção especial às relações entre a transição hídrica e a transição energética. Recuperar a boa saúde dos ecossistemas aquáticos e avançar para um cenário de uso de energia 100% renovável constituem dois objetivos essenciais da transição ecológica. No entanto, se ambos os objetivos estão, ou não, sempre alinhados é uma questão em aberto, que se relaciona com a problemática da produção hidroelétrica e seus efeitos nos ecossistemas fluviais, e da pegada hídrica do hidrogénio verde, entre outros aspetos. Garantir efetivamente a prioridade do abastecimento e, no início da década do restauro de ecossistemas proclamada pelas Nações Unidas (2021-2030), garantir caudais ecológicos adequados, recuperar a continuidade fluvial dos rios e travar a perda da biodiversidade aquática e dos serviços de ecossistemas, devem constituir objetivos urgentes da transição hídrica e transição energética. Estas questões são objeto de atenção de outra das áreas temática do Congresso: "Transição hídrica e transição energética: alinhados com a década do restauro de ecossistemas?"

Por fim, o Congresso dedica uma área temática a um dos grandes desafios da transição hídrica: Como progredir para modelos agrários ambientalmente sustentáveis, economicamente viáveis e socialmente justos, que reduzam as pressões quantitativas e qualitativas sobre os ecossistemas aquáticos, se adaptem às alterações climáticas e aumentem a coesão social e económica dos territórios? Como é que as políticas de resiliência e transição hídrica afetam os grupos vulneráveis do setor agrário e a população rural num contexto de desigualdade? Num contexto de diminuição do recurso disponível, como enfrentar o desafio da realocação com critérios sociais, do emprego, da defesa das populações enraizadas no território e da preservação do património comum? O debate, de longa data, é agora mais atual e urgente do que nunca, e inclui desde a poluição difusa aos modelos pecuários, a intensificação agrária, em geral, e o regadio, em particular, e o seu impacto nos modelos agrários sustentáveis, na pegada hídrica dos alimentos, nas relações entre o abastecimento urbano e os usos agrários, e o papel da agricultura em áreas inundáveis. Todos estes aspetos serão abordados na área temática: "Sustentabilidade do setor agrícola: Novas alianças para um ambiente rural com futuro".

O objetivo último do Congresso é aprofundar os debates com base no melhor conhecimento disponível, numa perspetiva interdisciplinar e com os contributos de investigadores, administrações públicas, grupos sociais, redes de cidadãos e empresas envolvidas no planeamento e gestão da água a diferentes escalas, para progredir numa transição hídrica justa, tão necessária como urgente, em Espanha e Portugal.
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